6 de jan. de 2013

O Som ao Redor


Em "O Som ao Redor",
a paisagem de prédios das cidades
"O Som ao Redor" é um instigante painel dos problemas e neuroses da vida nas cidades
Diretor pernambucano constrói clima de suspense crescente através de situações cotidianas
por Fábio Pastorello

O cinema pernambucano nos apresenta outro ótimo filme. Ano passado tivemos "Febre do Rato", de Claudio Assis. Esse ano temos "O Som ao Redor", do estreante em longas Kleber Mendonça Filho. Em comum, os dois filmes se passam em Recife e contam com o mesmo ator, o excelente Ihrandir Santos ("Tropa de Elite 2: O Inimigo Agora é Outro"). Mas os universos retratados são bem diferentes. Enquanto Assis retrata um universo bem peculiar, composto de personagens pra lá de alternativos, Mendonça retrata um cotidiano quase da porta ao lado.

A história acompanha a rotina de alguns personagens que moram num mesmo bairro, cuja grande figura é um homem que possui uma série de imóveis. Ele exerce uma influência grande no bairro, ainda mais pelo fato de que seus filhos e netos também moram nesse bairro. Personagem emblemático, ele afirma que apenas mora ali, mas quer que seus filhos e netos frequentem mais a propriedade rural que possui. Um dos netos é um corretor de imóveis e outro um arrombador de carros. Na vizinhança também vive uma mulher, atormentada pelo barulho do cachorro do vizinho. Para completar o painel, dois homens aparecem para oferecer serviços de segurança particular aos moradores.




Personagem do filme tenta relaxar, apesar dos
barulhos constantes do cachorro do vizinho
O painel de personagens sugere uma série de temas atuais que o diretor parece querer discutir porque lhe são próximos: as relações entre patrões e empregados, as relações entre vizinhos, a paranóia de segurança das cidades grandes e a vida entre prédios de concreto. Em entrevista à Revista Cinética, Mendonça afirma que seus filmes "talvez se dividam entre os que trazem experiências pessoais e os que são observações pessoais. No fundo, é tudo a mesma coisa, talvez algo impossível de ordenar."

Entre essas experiências e observações, está com certeza a forma como as pessoas se organizam nas cidades, pela fotografia do filme, que mostra os muros, as paredes, as portas, as grades, as ruas. E pelo sons que a junção de todas essas pessoas acarreta. No filme, o "som ao redor" do título, está em toda parte do filme e de nossas vidas, onipresente e sem descanso, representado principalmente na figura do cachorro do vizinho que não pára de latir.

O mais interessante, no entanto, é o modo como Mendonça constrói essa narrativa. Num clima de constante suspense, construído através de uma trilha sonora contundente, situações bastante corriqueiras são pontuadas. É como se o cotidiano representasse um perigo presente. É o clima de uma cidade grande. À noite, quando um carro passa pelos seguranças, diminui a velocidade, e pára sem motivo próximo a eles, desperta o medo do que irá acontecer. Ou quando um casal inicia uma transa numa casa, sob o barulho insistente de um telefone tocando, e um vulto passa por detrás deles. O suspense é constante, os fatos cotidianos.

Os dois seguranças particulares e as neuroses de
segurança da sociedade atual
Dessa forma, o filme é bastante interessante e envolvente no modo como traça esse painel da vida em cidade, dos seus problemas (e neuroses) atuais. O roteiro consegue manter o espectador interessado mesmo diante de uma história aparentemente ausente, que só irá se revelar no final. Enquanto isso, aposta e mantém o interesse em situações corriqueiras, e quanto mais cotidiano e banal as cenas parecem, mais próximos nos sentimos daquela realidade que está prestes a explodir.

Minha Cotação: * * * * 1/2


4 comentários:

  1. Gostei demais! O inferno são os outros!

    ResponderExcluir
  2. Bah.. que bom que tu gostou do filme! ^^

    Achei excepcional também, principalmente porque rendeu muita discussão com um amigo que assistiu comigo e DETESTOU a obra. Nunca defendi tanto um filme.

    Grande abraço!

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Essas divergências são ótimas, Adecio. Quer dizer, quando não acabam em briga, né? hehehe... Abs.

      Excluir