4 de fev. de 2013

Django Livre


Depois de explodir os nazistas, Tarantino parte agora em vingança a favor dos negros
Novo filme de Quentin Tarantino é quase um desabafo contra os atos de racismo nos Estados Unidos
por Fábio Pastorello

Quentin Tarantino mudou a história do cinema com "Pulp Fiction", em 1994. Nesse filme, ele fortaleceu (não vamos dizer criou, porque não eram de fato inovações) diversos tipos de narrativa no cinema, como as histórias com múltiplos plots (ou seja, a trama se divide em diversos personagens, também famosas nos filmes de Robert Altman), roteiros fora de ordem cronológica ou os longos diálogos que normalmente seriam encurtados pelos professores de roteiro. Depois de "Pulp Fiction", os filmes de Tarantino praticamente criaram um gênero no cinema. Felizmente, ele conseguiu se reinventar e manter a qualidade nos filmes posteriores, como em "Jackie Brown", na série "Kill Bill" ou no último "Bastardos Inglórios". Propondo um misto de inovação com homenagem a filmes antigos, Tarantino segue sua trajetória com "Django Livre" (Django Unchained, 2012).




Nessa produção, o gênero homenageado da vez é o western, em referência explícita (através de seu título) a um outro filme chamado "Django". O filme de 1966 é estrelado por Franco Nero, que faz uma ponta em "Django Livre". As referências não param por aí, lógico, os zooms acelerados de câmera, a trilha sonora e os duelos armados completam o cenário. Quando vi o trailer, não fiquei muito animado, pois western não é um dos meus gêneros prediletos, mas outros elementos típicos de Tarantino recuperaram meu entusiasmo: uma história de vingança (como em "Kill Bill" e "Bastardos Inglórios", por exemplo) e o pano de fundo da escravidão pareciam garantir mais um Tarantino excelente a caminho.

Christoph Waltz e Jamie Foxx, parceiros em "Django Livre"
E note, por exemplo, que em "Bastardos Inglórios" ele se virou contra os nazistas e reinventou a História, para que sua vingança pudesse ser concluída. Aqui, a vingança é contra os racistas sulistas norte-americanos. E para que sua vingança seja saborosa também para o público, Tarantino abusa de elementos, como o criticado (por Spike Lee) excessivo uso da palavra nigger (que é considerava ofensiva para os americanos) e cenas de violência explícita, como a já clássica cena em que um negro é devorado por cães. Ele até ridiculariza a Klu Klux Klan, com uma divertida e patética cena de um ataque racista. Tudo para que nosso desprezo pelos racistas, seja transformado em ódio e o desejo de vingança seja compartilhado pelo público.

Portanto, temos o Tarantino de sempre, ora violento, ora divertido, com excelente uso da trilha sonora, elenco impecável e divertidas referências cinematográficas, mas principalmente, como sempre genial. E olha que aqui ele num usa os múltiplos plots, mantendo toda a história centrada em dois personagens: no Django do papel título (Jamie Foxx, em papel originalmente escalado para Will Smith, que convenhamos ficaria ainda melhor para o papel), um homem negro que busca a mulher também negra que foi vendida como escrava; e no caçador de recompensas Dr. King Schultz (Christoph Waltz, ganhador do Oscar de coadjuvante por Bastardos e novamente indicado aqui) que se torna seu parceiro.

Leonardo DiCaprio em ótima interpretação
Waltz domina a primeira metade do filme, com um personagem altamente carismático, em interpretação novamente excelente. Depois, com a entrada de Leonardo DiCaprio como o dono da esposa de Django, o filme se divide entre Foxx e DiCaprio. Uma cena em particular chama a atenção, quando DiCaprio bate a mão com força sobre a mesa e acaba se ferindo de verdade. A cena foi mantida no filme, com DiCaprio atuando com a mão sangrando. E no final, quem assume o embate com Foxx (que segue uma jornada de vingança quase típica de um super-herói) é Samuel L. Jackson, no melhor personagem (e melhor interpretação) do filme. O empregado Stephen, embora negro, torna-se uma das figuras mais odiadas da trama.

Indicado para cinco Oscar, entre eles melhor filme, "Django Livre" parece ser barbada apenas para o prêmio de melhor roteiro. Assim como Pedro Almodóvar e Woody Allen, Tarantino escreve os melhores roteiros da atualidade (casualmente, ou não, os três também podem ser considerados os melhores cineastas da atualidade). E se em Bastardos, Tarantino propôs uma vingança dos judeus (contra os nazistas), em Kill Bill uma vingança das mulheres e em Django uma vingança dos negros, quem sabe Tarantino não continue sua saga contra o preconceito com um filme contra os homofóbicos de plantão. Se ele não o fizer, que Almodóvar o faça então.

Cotação: * * * * *


4 comentários:

  1. Pra mim, um dos melhores filmes do Tarantino. Genial.

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  2. Muito bom o texto Fabio!
    Django Livre é um grande Tarantino, não apenas por discutir racismo, mas pela paixão transparente do cara pelo cinema.

    Abs.

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    1. Obrigado, Rodrigo. É verdade, esses filmes que transbordam a paixão pelo cinema sempre me conquistam. Abs.

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