3 de out. de 2011

Família Vende Tudo


O filme tem no elenco o seu maior mérito. Principalmente Vera Holtz e Lima Duarte, os dois atores estão excelentes. O elenco é um dos grandes méritos do filme, mas também a direção de arte, o roteiro e a direção do filme conseguem colocar com grande veracidade uma família pobre. E isso não é fácil. Quantas vezes já não vimos filmes brasileiros e não acreditamos naquela reconstrução? Mas é um filme amoral, aliás a falta de moral é tratada com naturalidade, existe coisa mais brasileira que isso? Os personagens todos são podres, desde os pais que querem vender a filha, até a própria filha que se diz apaixonada pelo astro. Pena que do meio para o fim o filme parece que fica meio perdido e termina de um forma pouco convincente. Mas de qualquer forma, ele se regenera na cena final, na igreja, onde garante a última risada e a última "amoralidade" da família brasileira.

Minha Cotação: * * *




Família Vende Tudo: a bizarra e natural comicidade do subúrbio brasileiro

Comédia escapa de estereótipos explícitos para contar história sobre questionáveis escolhas dos menos favorecidos em busca de seus sonhos e, principalmente, de dinheiro.

Darlano Didimo
cinemacomrapadura.com.br

http://cinemacomrapadura.com.br/criticas/231137/familia-vende-tudo-a-bizarra-e-natural-comicidade-do-suburbio-brasileiro/

Poucas vezes o subúrbio brasileiro foi retratado na tela grande com tamanha comicidade e até fidelidade como neste “Família Vende Tudo”. Em geral, as favelas e bairros pobres do País presenciam histórias trágicas, as quais contribuíram para rotular o cinema nacional como marginal e violento. Sobra para as novelas (especialmente as de Glória Perez) a função de fazer um retrato mais alegre, com o conhecido bom-humor do povo brasileiro. A televisão, ainda assim, não consegue fugir de estereótipos, o que o novo filme de Alain Fresnot (“Desmundo”) faz com incrível inteligência ao reconhecer que seus personagens não são pessoas tão sábias, éticas e de bom gosto.

Mas não pense que eles são vilões malvados. São apenas alienados o suficiente para deixarem-se enganar por igrejas evangélicas golpistas e por serem extremamente influenciados pela televisão em suas escolhas “intelectuais”. São ainda donos de um padrão diferenciado de caráter, em que não é errado fazer pequenos furtos, falar um linguajar inapropriado, fundarem a própria igreja evangélica para se autofavorecerem e darem golpes em artistas famosos, por meio de uma estratégia que não hesita em usar o sonho de uma das integrantes da família.

Essa é Lindinha (ou, caso prefira – mesmo que seja bem improvável, Sabineide), uma adolescente absolutamente apaixonada pelo cantor brega Ivan Carlos (Caco Ciocler), o rei do xique, uma espécie de lambada dos dias atuais. Após ver seus pais, Ariclenes (Lima Duarte) e Cida (Vera Holtz), perderem a mercadoria contrabandeada do Paraguai, ela (Marisol Ribeiro) concorda em permitir-se ser assediada pelo astro para recuperar o dinheiro perdido e, de lambuja, realizar o seu sonho. Depois de alguns percalços pelo caminho, a estratégia funciona, o que dá início a uma confusão que quase acaba no altar.

Capturando com incrível naturalidade a maneira de agir dessa família, Fresnot exibe um universo bizarro e completamente sem glamour, aonde as pessoas cantam alto em plena longa viagem de ônibus (e também são abusadas sexualmente sem nenhuma dramaticidade inclusa), o sexo casual é palavra de ordem e o desrespeito e o amor pelos familiares caminham juntos. Jamais se levando a sério, mesmo porque a trama gira em torno de um grande ato “cara-de-pau”, o filme funciona como uma comédia de costumes, em que o essencial é a observação de como o humor é extraído de atitudes que parecem corriqueiras para seus personagens.

O roteiro do próprio Fresnot, escrito ao lado de Marcus Aurélio Pimenta, valoriza a banalidade. Do início ao fim, atos de estupidez são seguidos de mais atos de estupidez, não porque o longa quer fazer piada a todo momento, mas porque respeita a natureza dessas pessoas, incapazes de formular uma frase articulada para elogiar uma mulher ou de saber o significado de vasectomia. A falta de sabedoria também se estende ao famoso da trama, um homem que escreve letras musicais cujos refrões não trazem mensagem alguma (o mais popular deles diz “xique, xique, crau”) e que não consegue conter o próprio impulso sexual. A inspiração real seria a vida do cantor Latino, e as semelhanças são grandes. Latino, por sinal, aparece em participação especial.

A história, porém, perde-se no meio do caminho, bem como apresenta personagens que pouco dizem a que veio. A versão de Luana Piovani como atual esposa desconhecida do cantor que acaba, posteriormente, fazendo a própria carreira musical, não traz a criticidade suficiente, muito menos possui as referências à história verdadeira na qual se baseou. No mesmo núcleo está a produtora de Ivan Carlos que, mesmo com o grande tempo concedido, não faz rir em muitos momentos. O grande problema, no entanto, está no romance entre a mocinha e o astro, que entre atropelos e falta de explicações do roteiro, soa forçado, ainda que o final recupere parte da comicidade e até ouse prever um futuro não menos vergonhoso para suas inspirações.

Por outro lado, o elenco de “Família Vende Tudo” brilha. É gratificante ver Vera Holtz e Lima Duarte despirem-se dos vícios da televisão e terem interpretações convincentes como os pais irresponsáveis da menina Lindinha. Aliás, Marisol Ribeiro é um show à parte. A atriz dá à jovem a inocência e sensualidade de uma garota sem grandes instruções educacionais. Premiado como melhor ator do Cine Pe 2011, Caco Ciocler está agradavelmente estúpido como o cantor de pouco talento cujos excessos dão origem a esta divertida história, que não tem medo de ser bizarra em sua essência.
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Darlano Dídimo é crítico do CCR desde 2009. Graduado em Comunicação Social com habilitação em Jornalismo pela Universidade Federal do Ceará (UFC), é adorador da arte cinematográfica desde a infância, mas só mais tarde veio a entender a grandiosidade que é o cinema


FICHA TÉCNICA

Diretor: Alain Fresnot
Elenco: Marissol Ribeiro, Luana Piovani, Lima Duarte, Robson Nunes, Caco Ciocler, Vera Holtz, Marisa Orth, Ailton Graça
Produção: Suzana Villas Boas, Pablo Torrecillas
Roteiro: Alain Fresnot, Marcus Aurelius Pimenta
Fotografia: José Roberto Eliezer
Trilha Sonora: Arrigo Barnabé
Duração: 89 min.
Ano: 2009
País: Brasil
Gênero: Comédia
Cor: Colorido
Distribuidora: PlayArte
Estúdio: A.F. Cinema e Vídeo
Classificação: 12 anos

2 comentários:

  1. Acho que na maioria das vezes que o filme acaba perdendo em algo, mostra a falha no roteiro talvez. Não é fácil fazer um roteiro e ele simplesmente é a base de tudo.

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  2. É bem provável, Mimi. O roteiro é a base e o que inspira os demais profissionais envolvidos na realização de um filme. Se o roteiro não é inspirador, as etapas seguintes perdem força.

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